Denaly, lar das pessoas mais famosas do mundo, e também o meu verdadeiro lar. Era isso o que eu tinha ouvido? Nunca que iria imaginar uma coisa dessas. Como os meus pais puderam esconder isso de mim? Eu tinha o direito de saber a verdade, embora não tencionasse mudar-me para Denaly só para encontrar meus pais de sangue desnaturados.

-Soph, posso entrar? -perguntou-me Lucas que estava em frente à porta de meu quarto.

-Natürlich! Entre, meu anjinho!

Quando Lucas entrou, ele fez-me uma expressão de descontentamento:

-Eu já não te disse para não me chamar assim? -gritou ele.

-Mas é que você tem uma carinha de anjinho bem bonitinho -disse enquanto apertava as bochechas dele. Lucas resmungou por mais alguns minutos e quando ele se acalmou, pedi para que se sentasse.- O que você quer? Você não costuma vir até o meu quarto sem querer alguma coisa.

-Soph, já faz um mês desde que a mamãe morreu, e sabe... eu fico me perguntando onde será que o papai terá ido?

Não sei como estamos conseguindo sobreviver... Desde a morte de mamãe, o safado do nosso pai aproveitou para roubar todo o dinheiro e fugiu para algum lugar, abandonando-nos sem eira nem beira.

-Não faço a mínima ideia, Lucas. -menti para ele.- Mas eu sei que não foi só isso que você veio fazer aqui, não é?

-Como você é esperta! -sorriu.

-Sou mesmo! -gabei-me.- E então, o que você quer falar comigo?

-Minha irmã, eu sei que a morte da mamãe te abalou muito. Mas na minha opinião, temos que seguir as nossas vidas, e para começar, prometo-te que encontraremos os seus pais onde quer que...

-Quem disse que eu quero encontrar esses desnaturados? -interrompi-o com uma voz amarga.- Eles me abandonaram! -reforcei.- Assim, qualquer relação de pai e filho é cortada... Nem sei porque te contei esse fato...

-Soph, não pense que poderá me enganar! Eu sei muito bem que você quer encontrá-los de qualquer maneira. Eu te ouço falando a noite, tá?

-Não dá pra te enganar, não é? Mas me diga, como é que vamos encontrá-los?

-Primeiro, vamos seguir as nossas vidas!

-Vous avez raison! Temos que seguir as nossas vidas... e nada melhor do que viajarmos para Denaly, não acha?

-Wow!! Très bien! Essa foi a ideia mais sensata que você teve! Yeah! Vamos para Denaly!! -comemorou.

Só depois me dei conta de como é que iríamos para Denaly? Com o meu salário atual, eu nunca que conseguiria pagar uma viagem dessas. O que iria fazer? Só me restava vender quase tudo que possuía: a casa, os carros e o resto das jóias de minha mãe que não haviam sido roubadas pelo idiota do nosso pai, e ficar somente com meu Mini Cooper e com apartamento que meus pais haviam comprado há um tempo considerável.

 

II

Agora que ficamos "órfãos", Lucas passou a ser o homem da casa e decidiu cuidar de mim como se fosse um irmão mais velho. Realmente, ele é o melhor irmão de todos! Como ele é fofo...

-Ai, ai Lucas... Mal posso acreditar que amanhã estaremos em um trem para Denaly. Vai ser uma aventura e tanto, não é?

-Não te disse? Sabia que você iria adorar! Ei! E o seu trabalho? Como fica o Gander? Ele já sabe da viagem?

- O que você acha? Sua irmã é esperta, meu amor... -gabei-me.- O meu trabalho estará onde eu estiver. E se eu precisar viajar, levarei-te comigo! Já planejei tudo e vou continuar sendo a modelo internacional Sophie, porém em outra cidade. Não é demais?

- Só você mesmo, Sapinha! – riu.

Assim passei a tarde inteira conversando com Lucas, apesar dele não admitir que nos dávamos muito bem, o que aliás me deixava muito feliz, pois a partir de agora, conviveria com ele a maior parte da minha vida. Seria como uma mãe para ele e ele como um pai para mim. Adoràble!

 

III

Naquela noite fui dormir cedo, pois sabia muito bem que no dia seguinte ainda haveria muitas coisas a fazer em pouco tempo e provavelmente ficaria muito cansada depois que eu acertasse o que deveria ser feito. Incrivelmente, o que mais me intrigou aquela noite foi justamente um sonho que tive e mais parecia real para dizer a verdade:

-Vou acabar com você, Thunder! Eu juro pela minha vida que você não encosta mais um dedo nela! -gritou uma voz no fundo.- Eu te mato, seu traidor! Como pôde fazer isso?

-Vai me matar, Magnum? Pois eu não estou dando a mínima! -disse com sarcasmo.- Pelo menos eu consegui o que queria: acabei com a princesinha! Agora ela não tem como me vencer! Vocês foram muito idiotas! -zombou.- Acabarei com todos vocês!

-O que tu fizestes com a Metallic? Onde ela está? Cadê a Soph? -perguntou uma outra voz.

O que estava acontecendo? Por que falaram o meu nome e quem era Metallic? Tudo era muito confuso, mas ouvir o meu nome da boca de alguém fez-me despertar do lugar onde estava e logo ouvi um grito sair de minha boca: -Socorro!!! Logo vi que estava acordada e tudo aquilo que presenciei não passara de um sonho. Um sonho muito estranho por sinal, mas que dizia muita coisa. O que será que me esperava em Denaly?

 

 

-Soph, você está bem? Ouvi-te gritar por socorro... -perguntou Lucas preocupado, com uma voz sonolenta do outro lado da porta.

-Estou bem sim! Volte a dormir. Você precisa descansar. Amanhã será um dia pesado e por isso precisaremos estar bem dispostos.

-OK! Vê-se não me assuste mais, tá? Tomei o maior susto quando você gritou por socorro. Até pensei que fosse de verdade...

-Desculpe-me! Agora, vá dormir!

Lucas era mesmo um bom irmão. Se preocupava comigo mesmo que fosse apenas uma coisa insignificante como um sonho. E por eu saber disso, sabia que ele não ia dormir antes de saber o que tinha acontecido comigo.

-Entre, Lucas!

-Como você sabia que eu estava aqui? -perguntou.- Eu ia te dar um susto... -disse enquanto abria a porta.

-Sou sua irmã, não sou? Sei tudo a seu respeito! Tudo mesmo! -disse, dando uma risada maliciosa.

-Tá, mas me conte o que aconteceu? -perguntou ao mesmo tempo em que sentava em minha cama.- Por que você gritou por socorro?

-Ah, é que eu tive um sonho estranho. Só isso!

-Um sonho? -expressou-se indignado.- Nossa! Parecia que era de verdade. Mas ainda bem que não aconteceu nada com você. -disse aliviado.- Vou dormir que é o melhor que eu faço! Só você mesmo para me surpreender...

-Vá mesmo! Durma bem! Amo-te, meu irmão!

-Você também! Tchau!

Lucas era um irmão muito protetor e por isso me preocupava muito. Apesar de eu gostar de sua proteção, sabia que ele devia pensar um pouco na vida dele e esquecer um pouco essa mania de super-proteção.

Após Lucas se retirar, consegui dormir logo, o que não foi muito difícil. Era o resultado do meu cansaço e ainda que teria um dia cheio no dia seguinte. Além de viajar, eu era obrigada a entregar a casa. Que raiva! Eu nunca que iria perdoar o meu pai pelo que fez. Ele ia pagar todos os dias por ter nos abandonado e ainda mais, por ter mentido para mim a minha vida toda! Nunca mais o chamaria de pai. Nunca mais!? Só de lembrar que encontrei um bilhete pendurado na geladeira poucas horas depois do falecimento de minha mãe:

 

"Soph, perdoe-me por tudo! Um dia você vai entender tudo o que estou fazendo com vocês! Amo-te, minha filha!."

 

Na hora senti um nojo percorrer por todo o meu corpo, mas depois cheguei à conclusão de que ele nunca tinha sido um pai para mim e para Lucas. Por mais que minha mãe tentasse esconder, no fundo, sabia que ele tinha algum segredo guardado em sua alma, algo muito sério para dizer a verdade.

 

IV

Resolvi sair da cama, já que mesmo que fosse ainda às seis e meia da manhã, o sol estava totalmente reluzente e o céu, límpido.

-Bom dia, Soph! Acordou cedo, hein? O que aconteceu? Apareceu algo em seu quarto? -perguntou-me Cheff, todo preocupado.

-Não! É que eu tive um pesadelo e não consegui dormir mais. -respondi.- Sabe como é, né? -disse enquanto pegava a caixa de cereais e um pouco de leite.

-Pesadelos são terríveis mesmo... Mas você está bem? Não ficou assustada?

-Para dizer a verdade, um pouco, mas Lucas foi me acalmar, não é demais? -sorri.

-É! O menino Lucas é um bom garoto de fato. Você teve uma sorte em tê-lo como irmão. Muita sorte mesmo! -disse Cheff, enquanto pegava café das mãos de Dulce.

-De fato! Lucas foi um anjinho que caiu na minha vida.

-O nosso anjinho! Não se esqueça! -disse Dulce, piscando para mim.

Conversei com Dulce e Cheff durante um bom tempo, pois aquela seria a última conversa que teríamos antes de minha partida. Tenho o direito de aproveitá-los ao máximo.

-O que vocês conversam tanto que não me deixam dormir? -perguntou Lucas, aproveitando para pegar o cereal que estava ao meu lado.

-Estamos falando do anjinho da nossa vida! -apertei as bochechas dele.- E como somos bem-aventurados em ter-te em nossas vidas.

-Dá para parar? Eu não sou anjinho nem aqui nem na China! -reclamou.- E pare de apertar as minhas bochechas! -disse, ao mesmo tempo em que tirava os meus dedos de suas bochechas- Dói demais! -resmungou novamente.

-Já parei!

-E então Lucas, preparado para viajar com a sua irmã? -perguntou Dulce, mudando logo de assunto.

-Sim! Essa viagem vai ser a melhor aventura de minha vida! -respondeu com bastante entusiasmo.- A Soph vai encontrar os pais dela e eu vou ganhar um novo lar. Mal dá para acreditar! Se eu falasse isso para o Matheus e os outros...

-E você não vai falar nada, não é? -disse, cortando logo qualquer tentativa dele fofocar com os outros.

-Claro que não, Soph! Eu sei qual é a fama da família Rulfs. Não seria louco o suficiente para contar sobre a nossa partida.

-Acho bom! Não quero que a vizinhança toda saiba que sou adotada! Principalmente a Sra. Rulfs. Ela me dá nos nervos com aquela falsidade.

-Meninos, vamos parar de conversar? Já são sete e quarenta e daqui exatos quatro horas e vinte minutos, o caminhão de mudança estará aqui. - informou Cheff.

-É verdade! -exclamei.- Preciso me trocar! -disse apressadamente.- Tenho que fazer os últimos preparativos...

Cheff e Dulce eram como pais para mim. O zelo que eles tinham por nós era insubstituível.

 

V

Fui ao meu quarto pela última vez. Fiquei observando-o com um apelo nostálgico, no qual nem fazia ideia de que vivera tantos anos neste cantinho que antes era meu, somente meu. Fitei todos os pôsteres dos meus ídolos, os quais estavam grudados na parece roxa clara que eu mandara pintar há mais ou menos um ano. Olhei para o meu closet, para todos os meus sapatos separados por cor e para as minhas roupas que havia comprado na loja mais chique da cidade, a Fantasy World. Minha cômoda certamente era a mais chamativa, não apenas por ser do século XX (adorava antiguidades!), mas também porque era pintada de branco leite. Em cima dela, havia várias caixas de joias e maquiagens, motivo pelo qual a enfeitava mais. E por último, a minha cama, cujo material era o mesmo da cômoda e da minha penteadeira que possuía um espelho em formato de estrela.

Só de olhar para tudo aquilo, fazia-me ter cada vez mais certeza de que eu precisava ir para Denaly e esquecer um pouco dessa vida de princesa que sempre vivia. Agora nada disso me importava mais.

-Vai demorar? -bateu Dulce na porta.- Preciso arrumar o seu quarto!

-Dulce, acho melhor eu arrumar o meu próprio quarto. Preciso aprender a cuidar de mim mesma, já que em Denaly não vai ser igual aqui, né?

-Se você prefere assim, então eu estarei lá embaixo cuidando do Lucas.

-OK! Obrigada! -disse, já pegando minha mala rosa chique.

Até que foi divertido arrumar o meu próprio quarto e minhas malas, mesmo que eu ficasse triste em certos momentos. Já sabia que meu trabalho estaria feito até que o caminhão de mudança chegasse. Tudo daria certo e eu tinha certeza disso.

Antes de sair de meu quarto, verifiquei se não havia esquecido de alguma coisa. Tudo o que eu tinha naquele quarto estava tudo embalado e pronto para ser levado em poucas horas até o meu novo apartamento.

-Sigh! -suspirei alto.

-Maninha, tudo bem com você? -perguntou Lucas que parecia ter ouvido o meu suspiro.

-Sim! Só estava me despedindo de meu quarto. -pausei.- Não vou me acostumar com isso... -chorei.

-Eu também estou triste! É muito difícil despedir-me daquele quarto...

O quarto de Lucas, diferente do meu, era todo azul e possuía vários brinquedos espalhados. Todos os seus móveis foram comprados na mesma loja que os meus, a Lana Móveis, a melhor da cidade, que além que serem novinhos de fábrica, tinham também uma cor mais para o marfim.

-Denaly vai mudar as nossas vidas! -disse Lucas, empolgadamente.

-Oui, mon cher frère! Duvido que teremos a mesma mordomia que temos aqui. Meu dinheiro só dá para a passagem e alguns dias em um hotel. Ou seja, vamos ter que encontrar algum lugar para morar.

-Fico imaginando como será que é Denaly... Aquela cidade que sempre ouvimos ser a mais badalada e famosa do mundo... Nunca que iria imaginar isso... -disse Lucas, perdido em seus pensamentos.

-Pois é... -ri.- Só fico imaginando como eu vivia lá, como eram os meus pais, como era a vida por lá...

Fui conversando com Lucas enquanto que ia arrumando as últimas coisas que haviam no meu quarto e levava as caixas para o jardim, onde o caminhão apareceria para levar todas as roupas que não iria carregar comigo e todos os móveis de minha casa para o apartamento que ficava próximo, cerca de meia hora perto do litoral. Conforme o combinado, o caminhão apareceu ao meio dia. Havia tantos homens fortes e musculosos que até me senti um "esquilo" no meio de um monte de "gorilas".

A partir daquele momento, o meu dia foi ficando cada vez mais curto. Além de eu ter que supervisionar a mudança até o meu apartamento, tinha uma viagem programada para as vinte horas e trinta minutos do tempo médio de Greenwich.

 

VI

Impressionei-me com a eficiência dos carregadores. Eles despacharam as caixas em um tempo menor do que havia previsto. Logo, consegui arrumar todo o meu apartamento e me sobrou tempo para relaxar um pouco. Assim como eu, Lucas adorou o local. A vista que ele tinha para a praia era impressionante. Fiquei naquela varanda com meu irmão durante alguns minutos, até que Cheff apareceu para nos avisar:

-Soph, perdoe-me por interromper esse momento de deslumbre, mas sinto te informar que já está na hora de partirmos. Logo será a hora do trem partir. E sabe como eles costumam ser pontuais, não é?

Cheff estava certo quanto à pontualidade das estações de trens da Inglaterra. Se não fosse por ele, teríamos perdido a viagem, e olha que chegamos faltando exatamente 10 minutos para a partida. Dessa forma, fomos correndo para a bilheteria, que por sorte, havia pouca gente a nossa frente.

-Boa noite! Pretende viajar para onde? -perguntou a atendente.

-Durco. Duas passagens para a viagem das vinte horas e trinta minutos. -respondi nervosamente.

-Sim! O trem está para chegar. -pausou- 40 libras pela viagem.

-Aqui está!

-Certo! -pausou.- Aqui estão as suas passagens! Tenha uma boa viagem!

-Obrigada! -agradeci e logo peguei as passagens.

Faltava cinco minutos antes do trem chegar. Até chegar, tive que aguentar Lucas me encher a cada segundo com a pergunta:

-Quando é que o trem iria chegar?

Ainda bem que não faltava muito tempo e logo chegou pontualmente.

-Boa noite! Onde estão as suas passagens? -perguntou o verificador do bilhete de trem.

-Aqui estão! -entreguei a ele.

-Bom Soph, acho que é o nosso adeus. -disse Cheff, com ar de tristeza.- Espero que você e Lucas se cuidem. -disse, pegando Lucas no colo.- Adeus, minha filha!

-Adeus Cheff! -comecei a chorar.- Foi muito bom passar esses anos com você e com a Dulce, ouviu? Amo muito vocês! -disse abraçando-o.

-Vá! Espero que encontre o que está procurando! -disse Cheff me empurrando para entrar no trem, onde Lucas já me esperava.

Eu e Lucas nos sentamos cada um em um banco. Parecia até que estávamos em uma das aventuras dos livros de Agatha Christie... Que emocionante! Meu pensamento foi interrompido com a vibração do meu celular. Era um SMS de Gander:

 

"Espero que tenha uma boa viagem e que não se esqueça dos pobres mortais! (risos).

Vou sentir falta de minha garota!

Um beijo bem apertado,

Gander, o estilista mais feliz do mundo!!!"

 

Durco ficava a 187 milhas de Brywood, o que levaria pouco mais de 3 horas de viagem. Como não havia estação de trem em Denaly, tínhamos que descer em Durco para depois pegar um táxi a Denaly. Mas de uma coisa tinha certeza: Essa seria a viagem mais fabulosa de toda a minha vida.

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Natürlich! - Claro!

Vous avez raison! - Você tem razão!

Très bien! - Muito bem!

Adoràble! - Adorável!

Oui, mon cher frère! - Sim, meu querido irmão!

187 milhas - Aproximadamente 300 quilômetros

 

04 - Chegada a Denaly