Como eu admirava o meu irmão. Ele sempre manteve uma expressão tão calma e serena, como de uma criança que fica contente quando descobre novas coisas, mesmo que nós fôssemos a um lugar que nunca vimos na vida.

Desde que tive aquele sonho estranho, não conseguia mais dormir tranquilamente. Sentia medo de que voltasse a sonhar com isso e acabar vendo uma continuação daquela parte horrenda. A princípio, não acredito que os sonhos sejam uma premonição, como indicavam os místicos desde os tempos primórdios. Eu sinceramente sou mais racional do que crédula, afinal, nunca presenciei fenômenos sobrenaturais desde que nasci, então por quê iria acreditar nessas coisas?

Enquanto refletia, percebi que já tínhamos chegado ao nosso destino: Durco, cidade vizinha de Denaly. Era pouco mais de meia noite quando desembarcamos. Apesar de ser à noite, essa cidade era mais escura que o normal. Será que não havia tantos moradores como supunha?

Deixando as minhas indagações de lado, fomos ao único hotel que havia na cidade: Leng, nome estranho, por sinal. Assim que entramos, eu e Lucas nos surpreendemos com a negritude do local. Poderia até resumir a uma só palavra da impressão que tive: gótico. O lugar era cercado por paredes de pedra, os móveis eram de carvalho, e a luminária e os castiçais iluminavam o ambiente à velas, como nos tempos em que não havia eletricidade. A decoração era arrepiante: os quadros e as estátuas que compunham, tinham como temáticas a dor e o sofrimento.Ainda penso se eu ia me instalar em uma antiga masmorra. Acho melhor nem pensar nisso.

-Boa noite! Sejam bem-vindos ao Hotel Leng! É raro haver turistas a esta hora... -surpreendeu-se a recepcionista, que me olhava com certa desconfiança.

-Boa noite! Pois é... -respondi.

-O que desejam?

-Queremos um quarto só para hoje. É que vamos a Denaly amanhã. -respondi, olhando para Lucas que agora estava em meu.

-Denaly? Não acho que consiga ir para lá amanhã. -olhou-me com indignação.

-Por quê? -perguntei intrigada.

-Amanhã é o feriado da independência de Durco. Costumamos homenagear o Prefeito e a Primeira-dama, e como vai haver desfile na Avenida Principal, os táxis e as charretes não vão estar em funcionamento.

-Então, quero duas diárias. -disse, um pouco decepcionada, já que não tinha me atentado a esse pormenor.

-Espero que goste do hotel, senhorita! -disse-me um homem que aparecera de repente e que aparentava ser o gerente daquele lugar horripilante. Era um homem de rosto rechonchudo e corpulento, mas que possuía uma aparência melhor que a empregada que não parava de me olhar- Não estamos muito acostumados a receber turistas por estas bandas. A maioria aparece aqui para visitar Denaly e... -parou de falar e mudou logo de assunto.- Desculpe-me, intrometer, mas como acabei ouvindo a sua conversa com a nossa recepcionista, fiquei pensando porquê uma jovem iria para Denaly nessa época do ano. Por acaso conhece alguém de lá?

-Não, só estou de passagem! -respondi brevemente.- Como ouvi dizer que Denaly é uma cidade maravilhosa, fiquei com vontade de visitá-la.

-Compreendo! -respondeu o gerente.

-Agora estou me lembrando de você! -exclamou.- Você não é aquela modelo metida e sonsa, é? -acusou-me.

Era só o que me faltava. Mal acabei de chegar e já recebi uma injúria dessa. Se ela pensava que iria cair no jogo dela, estava enganada.

-Poderia me entregar as chaves,s'il vous plâit? -dirigi-me ao gerente.

-Imediatamente! -afirmou, pegando logo as chaves.- Aqui está!

Saí do hall assim que peguei as chaves. Não estava a fim de continuar naquela conversa idiota que não me levaria a nada. Com aquela confusão, Lucas até acabou acordando e logo queria saber o que estava acontecendo. Expliquei a ele o ocorrido assim que chegamos ao quarto, e em seguida ficamos batendo papo quase a madrugada inteira, até ele ter uma ideia brilhante:

-Por que não nos dividimos e vemos se alguém sabe algo a respeito de seus pais?

-Bonne idée!

Dormimos logo, já que estávamos cansados após um dia cheio que tivemos.

 

II

A população de Durco era completamente fria e rabugenta, e suas respostas nada me agradavam. Como já sabia que não obteria informações, encerrei a investigação e resolvi entrar em uma pequena cafeteria chamada Coffee's True, que se localizava longe do centro da cidade. Aparentava ser agradável, apesar de ser escura por dentro. Tudo era forrado por madeira de carvalho, havia poucas janelas, porém amplas, diversos tipos de mesa, além de uma bancada que dava em frente ao balconista.

Antes de me sentar, peguei o jornal que estava disponível aos clientes e sentei-me na bancada. Assim, pedi um café e enquanto aguardava a bebida, abri o jornal e logo me deparei com uma manchete intrigante:

 

"Caso Victoria é tratado mais uma vez como chacota"

 

O jornal em si não explicava nada sobre o caso. Pensei logo em ver se havia alguém com quem pudesse conversar a respeito do assunto. No momento não havia, até aparecer um lindo garoto, que devia ter a minha idade. Era alto, possuía cabelos castanho caramelizado, olhos verde profundo, uma feição madura, pernas longas e pele branca de dar inveja. Ele percebeu imediatamente que o fitava desde que entrara e dessa forma, dirigiu-se a mim:

-Por que estava me olhando, senhorita? -perguntou-me com um certo charme.

 

 

 

-Pensei que você poderia me esclarecer o que seria o Caso Victoria. -respondi com nervosismo.

-Não me diga que você não conhece o Caso Victoria? -perguntou indignado.- Como isso é possível? É o caso mais famoso da região. -disse-me grosseiramente.

-Poderia me contar? -pedi, ansiosamente.

-Como posso contar algo a alguém que nem é capaz de se apresentar? -disse-me com um tom de ironia.

-É mesmo! Desculpe-me pela minha falta de educação. Meu nome é Sophie Smith. Venho de Brywood e tenho dezesseis anos.

-Ah, agora sim! -riu.- Prazer! Meu nome é Callum Weston Bowyer, também tenho dezesseis anos e moro em Durco.

-Prazer em conhecê-lo! -respondi.- Por acaso é bom viver aqui? -perguntei com entusiasmo.

-Então, você não estava querendo saber do Caso Victoria? -perguntou, cortando logo o assunto.

-Sim! Poderia me contar?

-Claro! O Caso Victoria foi um episódio de sequestro que houve há alguns anos com a filha da dona das fábricas Weber: Marcella von Weber. Não sabe como isso abalou toda a cidade...

-Nossa! -exclamei.- Como é que ela conseguiu viver tanto tempo sem a filha? -perguntei horrorizada.

-Isso ela... -interrompeu a conversa ao ver que o celular tocara.- Espere um pouco, que vou atender!

Callum estava conversando em um outro idioma, do qual eu não tinha conhecimento. O que será de tão importante nessa conversa? Se bem que ele não demorou mais que 15 segundos para falar.

-пока! -disse ele, ao finalizar a conversa.- Será possível deixarmos a conversa para outro dia? -perguntou.- Tenho um compromisso agora.

-Tudo bem!

Assim trocamos os números de nossos celulares e ele saiu correndo de lá, como se o compromisso fosse mesmo algo urgente.

 

III

Lucas também não teve a mesma sorte que eu e então nos restava somente aguardar o dia seguinte.

Sendo assim, na manhã seguinte, deixamos o hotel e fomos até o ponto de táxi. A ansiedade em chegar a Denaly era tanta que até tinha me esquecido do meu novo amigo Callum e de toda aquela história do Caso Victoria. Assim que chegamos ao ponto, havia somente um táxi. Quando nos aproximamos, percebemos que pela expressão do motorista, ele não recebia um cliente há muito tempo:

-Bom dia! Desejam ir para onde? -perguntou o motorista.

-Bom dia! -respondi- Gostaríamos de ir a Denaly.

-Sim, senhorita!

Entramos no táxi aparentemente confortável. O motorista nos informou que a viagem levaria cerca de uma hora e que para isso, passaríamos por uma grande floresta, chamada Blue Forest, cuja imponência era dada pela sua variedade de espécies animais e vegetais. Quando passamos por lá, vi que era tudo muito lindo e que o céu carregado de Durco desaparecera a partir do momento que entramos pela floresta. Agora sentia que encontraria algo muito melhor. O motorista se sentiu tão animado com a nossa presença, que resolveu contar um monte de histórias sobre a floresta e suas belezas, o que foi muito interessante, por sinal.

Depois do longo percurso, chegamos a entrada de Denaly às dez da manhã. Como era impressionante aquele lugar cercado de brilho dourado, que mais lembrava a caixa forte do Tio Patinhas, cercada por suas ricas moedas de ouro. Logo na entrada estava escrito:

 

"Para se morar aqui, é preciso dinheiro e muita fama!

Bem-vindos a Denaly!"

 

Logo que li, percebi que a partir daquele momento estaria entrando em uma cidade surreal. Seria aqui a minha cidade natal ou era um mero engano?, perguntei a mim mesma, enquanto admirava aquele esplendor.

-Chegamos, crianças! Aproveitem bem a estadia e divirtam-se! -disse o motorista.

-Eu é que agradeço! -paguei-lhe, enquanto agradecia.

-Tenha uma ótima viagem de volta a Durco! -disse Lucas.

O motorista nos deixara em frente a porta do Hotel Pacific, a única da cidade e a mais luxuosa do Reino Unido. Sinto que iria sair bem caro essa minha viagem. Mas o que importava é que chegara ao meu destino e a aventura começaria a partir daquele momento. Como dizia um grande poeta de Denaly, em sua famosa poesia:

 

"Denaly, lar das pessoas mais famosas do mundo!"

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S'il vous plâit - Por favor

Bonne idée! - Boa ideia!

пока! - Tchau!

 

05 - Emily von Weber

 


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