Eu e Emily deixamos a conversa para o dia seguinte. Assim, acordei bem cedo e fui correndo até a cafeteria onde nos falamos na última vez:
-Então, já pensaste em como encontrar teus pais? Quero dizer, não paraste para pensar que é necessário mais pistas para isso? E além do mais, tu e teu irmão precisam de uma casa para morar e de uma escola para estudar... -disse-me Emily, empolgada com a conversa.
-Tirando o fato de que preciso de uma casa para morar, sabe que até me esqueci de que eu e meu irmão precisamos de uma escola para estudar? Que burrice a minha. Já estamos em férias de verão e eu aqui, despreocupada com os estudos... E agora, o que eu faço? -perguntei a ela, preparando-me para entrar em colapso.
-Lembra-se da conversa de ontem, quando a minha mãe me perguntou se irias estudar no nosso Instituto? Pois bem, por que não tentas prestar exame de admissão? Assim poderíamos estudar juntas, não é? -propôs Emily, sorrindo ingenuamente.
-Seria uma boa ideia! Aposto que Lucas iria adorar.
Nunca pensei que faria amizade com uma menina tão especial como a Emily. Ela sempre olhava nos meus olhos quando conversávamos e demonstrava grande interesse quando contava as viagens que fizera até chegar aqui. Nos despedimos por volta das dez e meia da manhã e fui correndo até o hotel para contar a novidade ao meu irmãozinho:
-Lucas! -abri a porta bruscamente, pulando em sua cama logo em seguida.- Acorde!!
-Argh! -assustou-se.- O que foi Sapinha? Por que tinha que pular em cima da cama? -reclamou.
-Você não vai acreditar no que aconteceu: ontem esbarrei-me com uma menina chamada Emily. Ela é a pessoa mais bondosa e gentil que eu conheci nesse mundo!
-E daí? -mostrou desinteresse.- Por que todo esse alvoroço por causa de uma menina? -perguntou-me irritado.
-É que ela é filha de Marcella von Weber, que é dona da fábrica que vimos ontem. Lembra daquele muro gigantesco? Aquele era o Instituto Medic, lar das crianças e adolescentes mais famosos desse país.
-Interessante! Nunca pensaria que aquilo fosse uma escola. E que sorte a sua hein? Virou amiga dessa Emily, não foi?
-Sim, e tem mais: A Emily sugeriu que prestássemos o exame para o Instituto Medic. Sabe, depois de tanta correria, nem me toquei que precisávamos de uma escola para estudar. Então pelo menos se prestássemos essa prova, não teríamos problemas quanto a isso.
-Nem mesmo eu pensei nisso. -riu.- Ah, sim! Vai ser muito bom para nós, já que não sabemos quanto tempo ficaremos por aqui.
-Acho que devemos procurar por uma casa em primeiro lugar, não acha?
-Sim, sim! Este hotel é caríssimo demais para o nosso orçamento. -realçou.- Mas será que aqui existe uma casa que tenha aluguel em conta?
-Deve existir sim e vamos encontrar! -disse muito confiante.
-Então vamos procurar logo! -levantou-se da cama, entusiasmado.
Fomos até a imobiliária em busca de informações. Lá, descobrimos que havia uma pequena casa disponível, localizada na periferia de Denaly. Tinha um quarto, porém amplo, uma sala de estar aconchegante, uma cozinha e um banheiro, além dele estar completamente mobiliado. O aluguel era cerca de mil libras mensais, o que era muito conveniente para mim. Li as cláusulas do contrato e assinei em seguida.
Arrumamos as bagagens e mudamos imediatamente para lá. Sorte que estava tudo limpo e só me restava abastecer a geladeira e comprar utensílios domésticos.
II
Depois que nos mudamos, fomos nos inscrever para o exame que ocorreria no próximo mês. Mais tarde, procurei Emily, convidando-a para uma visita a minha casa:
-Claro que adoraria! Pode ser agora? -perguntou, com enorme brilho nos olhos.
-Sim! Assim você poderá conhecer o meu irmãozinho fofo.
-Tu falas tanto dele que até me deu vontade de conhecê-lo.
-Você vai adorar!
Andamos por cerca de meia hora até chegarmos em casa.
-É aqui que vives? -surpreendeu-se- Mas é tão simples e tão comum. Não combina nada contigo. -mostrou-se decepcionada.
-Pelo menos a casa é confortável.
-Se quiseres, eu posso pedir à mamãe para te hospedar na minha casa.
-Não precisa. Não quero ficar dependendo dos outros. Quero viver por mim mesma.
-Certo... -ficou triste.- De qualquer forma, se tu passares, deverás morar no alojamento escolar.
-Não sabia! -exclamei.
-Como muitos dos alunos vêm de outras cidades ou de outros países, eles precisariam morar em algum lugar seguro e próximo a instituição. Então para evitar confusões, seria mais conveniente e justo que todos vivessem em regime de internato.
-Compreendo... -murmurei.- Deve ser uma ótima experiência...
-Podes acreditar que sim.
-Quanto tempo vocês ficarão conversando aí fora? -perguntou Lucas, que estava na janela.
-É mesmo! Lucas, esta é a Emily von Weber, minha nova amiga!
-Então tu és Lucas, o irmãozinho fofo da Soph? -analisou.- Como és lindinho! -acrescentou.
-Soph, por que ela fala tão formalmente? -perguntou Lucas, ignorando Emily.
-Ela é assim, Lucas...
-Emi, você tem doces? -perguntou.
-Lucas! Já não te pedi para parar de pedir doces aos outros? -repreendi-o.
-Não posso cumprir uma coisa que nem prometi, já que eu cruzei os dedos. -disse ele.
Emily riu.
-Vós dais bem, deveras! -opinou.- Não tenho doces no momento, mas posso te encomendar alguns da doceria.
-Valeu, Emi! -abraçou-a.
-Desculpe-me pelo meu irmãozinho.
-Tudo bem! Ele é uma gracinha.
Aquilo era a milésima vez que Lucas me fizera passar vergonha.
III
Emily e eu ficamos conversando por um longo tempo, o que chateou Lucas, que por ter perdido o centro das atenções, começou a nos incomodar com suas manhas. Dei a ele dinheiro para que comprasse alguns bolos para nós. Assim, meu irmão saiu contentíssimo e nos deixara em paz novamente.
Com o ambiente mais calmo, Emily contou-me que a prova do colegial seria mais difícil este ano, enquanto que para o oitavo ano seria a mais fácil. Ela se oferecera para me ajudar nos estudos e dessa forma, estudamos juntas durante um mês, o que foi muito divertido, uma vez que nós duas adorávamos estudar e tínhamos muita facilidade quanto a esse assunto. Foi até engraçado ver a cara de indignação de Lucas ao se ver obrigado a estudar conosco. Ele vivia contestando:
-Por que devemos estudar nas férias? Já não basta ter que estudar o ano inteiro? -resmungou.- Quero descanso e ponto final!
Emily riu tanto que o meu anjinho ficou vermelho de raiva. Parecia até um tomate maduro.
Lembro-me que Emily tinha me dito que o Instituto passara por reformas, desde que fora adquirida pela família von Weber e pela família Medic há cerca de dez anos. Ela não me contara sobre o sistema de ensino do Instituto, já que pretendia me fazer uma surpresa.
Nesses momentos, acabei recordando-me da conversa que tive com Callum a respeito do Caso Victoria. Cheguei até a cogitar a possibilidade de eu ser ela. Mas acho que é uma tremenda bobagem. Seria coincidência demais e afinal, não estou dentro de um romance para acontecer uma coisa dessas. Ainda que, não sou parecida com a Emily e nem com a mãe dela. Só os olhos azuis esverdeados que são iguais, porém, bem comuns nessa cidade. Até Lucas tem essa cor. Falando nele, agora que estou pensando, se mamãe era estéril, então por quê ele é tão parecido com ela? Será que aconteceu um milagre e por esta razão teve um filho? Ainda bem que não contei esse detalhe ao meu anjinho. Seria de cortar o coração vê-lo abalado. E a Emily? Será que pensou nessa possibilidade? Não... acho que não. Pela expressão transparente dela, não...
IV
Finalmente chegara o dia do exame. A prova seria realizada às nove da manhã e teria duração de três horas. Eram somente 10 questões discursivas, mais redação.
Acordei cedo só para ser a primeira a chegar. E para isso, tive que ligar para o táxi nos levar até o Instituto. O motorista apareceu vinte minutos depois que desliguei o telefone e chegamos ao destino em 15 minutos. Por coincidência, Emily estava no portão do Instituto:
-Vim desejar-te boa sorte! -disse Emily.
-Obrigada! Mas, o que você vai ficar fazendo hoje?
-Bem, eu combinei de ir a Durco com a minha governanta.
Emily não faria a prova por ela ser veterana. Somente os novatos tinham que se submeter a este teste.
-Quem dera eu voltar a ter um luxo desses...
-Não precisas ficar preocupada! Quando entrarmos no Instituto Medic, nós seremos tratadas como reis e rainhas! -disse Emily, rindo.
-É mesmo? Nossa, que sonho, hein? -ri.
-Sim! Eu exigi a minha mãe que tratasse os alunos com nobreza. -gabou-se.
-Só você mesmo para exigir isso de sua mãe... Bom, tenho que entrar! Muito obrigada por ter me ajudado nos estudos. Tchau!
-Tchau! Depois me contes como foi na prova, okay?
-Está bem! Até logo!
A partir dali seria o começo de minha nova vida. O que estaria me esperando o futuro?